[TRANSCRIÇÃO] CF 033 – Leitura Beta

Transcrição referente ao episódio 033 do Curta Ficção, sobre “Leitura Beta”, que pode ser acessado clicando neste link.

Transcrição por Ton Borges


[Thiago Lee] Bem-vindos ao primeiro episódio do Curta Ficção de 2018!

Eu sou o Thiago Lee.

[Jana Bianchi] Eu sou a Jana Bianchi.

[Thiago Lee] E hoje nós vamos falar sobre “Leitura Beta ”.

[Vinheta]

[Thiago Lee] Feliz Ano Novo, ouvintes do Curta Ficção!

[Jana Bianchi] AEEEEEEEEEE! FELIZ ANO NOVO!

[Sons de fogos de artifício]

[Thiago Lee] E como aqui nos bastidores do Curta Ficção a gente não para, estamos lançando um episódio para você que não para de escrever e produzir.

[Jana Bianchi] É, considere isso um presente, um incentivo nosso aqui para você sentar sua bunda na cadeira e escrever aquele conto ou aquele capítulo que você não está conseguindo terminar de jeito nenhum.

Então, sem desculpas de ressacas alimentares ou alcoólicas, enfim, e vamos escrever!

 [Thiago Lee] Sim e hoje vamos continuar aquela série de episódios que começamos no último do ano passado sobre o ciclo de vida de um texto, desde o rascunho até o texto está pronto para ser publicado.

[Jana Bianchi] Se você ainda não ouviu (ou ainda não leu a transcrição) o episódio 032, corre lá, aproveita que ele é bem curtinho, ele tem só 17 minutos, então vai nele primeiro:

(http://curtaficcao.blubrry.com/transcricoes/curta-ficcao/transcricao-cf-032-terminei-meu-rascunho-e-agora/ )

(http://curtaficcao.blubrry.com/2017/12/18/curta-ficcao-032-terminei-meu-rascunho-e-agora/ )

[Jana Bianchi] No episódio de hoje, a gente vai levar em conta que você já terminou seu primeiro rascunho do texto, já deixou ele descansando e retornou para o texto para fazer aquelas mudanças necessárias, aquelas que você foi capaz de notar sozinho, então agora o seu texto está pronto para ser mostrado para outras pessoas que são “os leitores betas”. Nesse episódio, a gente vai abordar esse assunto tanto da perspectiva do autor que está submetendo o texto para essa etapa, quanto da perspectiva da pessoa que está fazendo ali também a leitura beta.

Portanto, você já compartilha esse episódio com seus amigos que são leitores beta que ainda não são ouvintes aqui do Curta Ficção e vamos para o episódio!  

[Thiago Lee] Mas antes de mais nada, é bem importante nós explicarmos o que é a “leitura beta” também chamada de “betagem”. Na verdade, é especialmente importante deixar claro qual a diferença entre a leitura beta e a leitura crítica, que a gente vai abordar em algum outro episódio, provavelmente com algum convidado bem experiente nesse serviço. 

Então vamos lá: A leitura crítica é um serviço profissional e não é a mesma coisa que betagem, para se ter um máximo valor, a leitura crítica deve ser feita por uma pessoa que esteja suficientemente inserida no mercado literário e no mercado editorial, já que esse serviço tem como objetivo apontar falhas ou fortalezas de um texto, tendo como objetivo justamente a entrada e a boa recepção da obra no mercado literário.

Ou seja, existe todo um contexto, não é apenas a qualidade literária, não é o único critério utilizado. Geralmente a leitura crítica leva em consideração não só a qualidade do texto, como também os aspectos comerciais do livro, como a existência de um bom público alvo, associação a alguma tendência, algo que possa impulsionar a venda do seu livro.

[Jana Bianchi] Já o termo leitor beta, que é análogo ao termo “usuário beta” que é mais usada aí no mercado de tecnologia, é usado para se referir simplesmente ao grupo de “segundos leitores do texto”, sendo que obviamente o primeiro leitor é o próprio escritor. Então a ideia é justamente que essa pessoa ou essas pessoas leiam o texto com o mínimo de viés possível e dê um retorno sobre o texto sob a ótica de um leitor comum.

Ou seja, é assim, imagina que o cara foi lá comprou o livro com aquela versão do texto na livraria, que a gente sabe que não seria o caso, mas imagina que o leitor comprou aquela versão do seu texto e aí resolveu ler e escrever um texto nas redes sociais sobretudo se ele gostou ou não gostou do livro. A diferença é que o leitor beta vai fazer isso no privado, vai falar só com você, e também vai fazer isso, que é mais importante, antes da publicação. Ou seja, o autor vai ter tempo de alterar o que acha pertinente dentre esses apontamentos de leitura beta.

Ao contrário da leitura crítica, a leitura beta não é um serviço editorial, não é um serviço por si só e sim uma boa prática, geralmente feito na base do favor, embora alguns, como eu mesmo e o Lee também, consideram essa boa prática praticamente “obrigatória”. E ao contrário da leitura crítica também, é algo que pode ser feito por qualquer pessoa, não precisa ser profissional, ou “quase qualquer pessoa”, o que nos leva ao primeiro ponto do episódio: Como escolher o leitor ou os leitores betas da sua história e quantos betas ter.

[Thiago Lee] Não existe um padrão ou uma regra para isso, como tudo que envolve a escrita. Quanto ao número, a única coisa que é meio que um consenso, é que é interessante ter mais de um beta, porque desse jeito você pode ter vários posicionamentos sobre cada ponto e entender quando há alguma crítica que  é mais questão de gosto do que um ponto objetivo. Muitos leitores betas, pela mesma razão, podem tornar tudo mais confuso e até inviável. Acredito que três ou quatro ou cinco betas podem ser o suficiente, isso aí vai depender da sua situação. 

E sobre o leitor em si, há três aspectos que a gente acha importante considerar:

O primeiro deles é a proximidade do leitor beta com o seu público alvo

O segundo deles é o conhecimento de escrita que o seu leitor beta tem

Por último, o laço que você tem com o seu leitor beta. 

Sobre o primeiro tópico, é importante levar em consideração o que a Jana acabou de comentar, você quer a impressão de pessoas que representem o seu leitor médio. Tem gente que acha importante ter leitores beta que consideram o seu livro totalmente fora da zona de conforto deles. Realmente essa pode ser uma boa ideia para você ter uma visão bem isenta do que pode melhorar na sua história, inclusive falando de uma experiência minha, no meu primeiro livro, um dos meus betas, ela não lia nada de fantasia, ela lia uma ficção mais real, mais clássica e tal, e não conhecia muito fantasia, mas isso me ajudou a dar um passo para trás, me desgarrar de alguns excessos que os escritores de fantasia tomam e não percebem e isso só trouxe benefícios. Mas assim, eu soube como lidar com as críticas dela em conjunto com as críticas de outros leitores betas que liam bastante fantasia.

De qualquer forma, é recomendadíssimo que pelo menos um dos seus leitores beta, senão a maioria deles, pertença ao público alvo da sua história, quanto mais específico melhor, assim você vai ter uma visão das pessoas que de fato vão se interessar pela premissa do seu livro a ponto de pegá-lo para ler. 

[Jana Bianchi] Sobre o segundo tópico, que é o conhecimento de escrita que seu leitor beta tem, certamente você vai ter retornos diferentes de um leitor beta que é escritor ou que não é escritor. Como o Lee já disse, não existe regra nisso, mas nós achamos que é uma boa ideia ter um grupo misto ali de leitores que escrevem e leitores que também são totalmente leigos na criação literária. 

O leitor beta que também é escritor, provavelmente ele vai ser mais assertivo na hora de criticar algumas coisas pontuais, tanto por ser capaz de entender mais fácil o que incomoda ele, por conhecer a estrutura da história e tudo mais, quanto por ser capaz descrever para você direitinho qual é problema, o que ele está vendo ali que é problemático, inclusive usando termos mais claros. 

O problema é que todo escritor naturalmente tem o impulso de considerar o modo com que ele teria escrito a história e pessoas diferentes podem e devem escrever de forma diferente. Então, sempre vai ter essa pulguinha na orelha, o texto pode estar bom, mas o leitor que é escritor sempre vai ter um certo viés do tipo, “Ah, eu não teria escrito assim”, que não é necessariamente o jeito certo de escrever. Além disso, a maior parte de seu público leitor, até por uma questão estatística, provavelmente não vai ser formada de escritores, a maior parte dos seus leitores serão só leitores. 

Então, mais uma vez, é super recomendado que você tenha pelo menos um leitor beta, senão a maioria, que seja leigo, só leitores ali que gostam muito de ler e que sejam observadores, claro.

[Thiago Lee] Por último, sobre o terceiro aspecto que a gente mencionou, é importante se considerar o laço que você tem com o leitor beta para que ele não influencie nem na honestidade do leitor, nem na sua consideração sobre a crítica levantada. Aqui é onde a gente reforça que bem provavelmente sua mãe não é a melhor pessoa para a leitura aberta de seu livro. De novo, equilíbrio sob esse aspecto é recomendado, pode ser uma boa ideia misturar pessoas que são pessoas conhecidas e cuja opinião você confia cegamente, voltando ao exemplo do meu primeiro livro, um dos meus leitores beta é meu melhor amigo, mas assim, ele é um leitor assíduo e eu confiava muito que ele iria criticar tudo o que ele visse, eu tinha essa abertura com ele. É uma boa ideia você misturar pessoas que são conhecidas, cuja opinião confia, com pessoas que não conhecem muito seu trabalho ou você e que por isso vão poder dar opinião bem isenta sobre a qualidade do texto.

Novamente, isso vai depender da situação e desse equilíbrio que você vai fazer.

[Jana Bianchi] Bom, vale aqui dizer uma coisa que pode incomodar alguns, mas é importante reforçar: o seu principal objetivo com a leitura beta deve ser conhecer os pontos fracos e os pontos fortes do seu texto e não ser elogiado ou ter o seu ego massageado. A ideia é que você use a leitura beta para tratar o seu texto para publicar a melhor versão desse texto, para, aí sim, você receber os louros e os elogios por ter feito um bom trabalho. Claro que você pode mandar seu texto para gente que você sabe que vai responder só elogiando, pode tudo, ainda estamos num país livre, mais isso não necessariamente vai fazer o texto melhor e aí pode ser que depois de publicado, você receba as críticas aos problemas que você não solucionou.

Então isso aqui é uma coisa importante, saiba muito bem antes qual é o seu objetivo quando você estiver procurando um leitor beta. Você só quer ouvir elogios? Ok, se é essa é a sua vontade, sem problema. Mas saiba e entenda que isso pode vir depois como críticas a coisas que você não deu atenção quando deveria, entendeu? Depois de publicado, não adianta chorar, né. Agora, não, o que você quer mesmo é melhorar o seu texto? Então é importantíssimo você procurar pessoas que vão mesmo ali criticar e apontar as coisas que importam.

[Thiago Lee] Exato. 

Dito isso, agora nós vamos dividir o programa em duas partes: Coisas que uma boa leitura beta deve contemplar, que é o que deve servir tanto para quem está pedindo a leitura como para quem está fazendo, e também como reagir ao retorno de uma leitura beta que você pediu.

Para apoiar essas duas discussões, a gente vai usar o material disponibilizado pela Mary Robinette Kowal, que é uma autora premiada, americana e host por muito tempo do podcast Writing Excuses, que é um dos podcasts que inspirou o Curta Ficção, e vamos deixar no post do episódio aqui o link para um infográfico que ela disponibilizou. Neste infográfico, ela aponta que uma pessoa pode criticar um trecho de três formas: Apontando um sintoma, diagnosticado causas de um problema ou prescrevendo como resolver esses. 

Uma leitura beta valiosa é aquela que lista os sintomas, tudo aquilo que, como o próprio nome já diz, o que o leitor está sentindo conforme avança na leitura. Então tanto a tentativa de diagnosticar qual o problema de um texto, quanto sugestão do que fazer para melhorar são coisas que quase sempre acontecem quando o leitor beta é também um escritor e que na maioria das vezes mais atrapalha do que ajuda. Como o leitor só vê o que está no papel e não o que está dentro da cabeça do escritor, a tentativa de avançar para algo mais do que sintomas é bobagem.

[Jana Bianchi] Os sintomas podem ser infinitos, já que uma pessoa pode sentir um monte de coisa enquanto ela lê. 

Mas os sintomas mais pertinentes podem ser divididos bem satisfatoriamente em quatro categorias é a Mary propõe que é “o maravilhamento”, “o tédio”, “a confusão” e “a descrença”. Essas são as coisas que como leitor beta, se você for um leitor beta de algum texto, você deve registrar sempre que sentir e como escritor, essa função é pedir objetivamente que o seu beta tente, primeiro, se limitar a escrever o que ele sente, como o Lee já disse, é focar nos sintomas, e segundo, focar nesses grupos de sentimentos.

Geralmente, o que que eu faço? Eu escrevo um e-mail listando esses quatro sentimentos, explicando esses quatro grupos de coisas e eu peço para meu beta comentar no arquivo ou me mandar um arquivo separado, marcando todos os pontos do texto em que ele sentiu cada uma das coisas. 

Aí destrinchando um pouquinho aqui, a gente vai falar um pouquinho de cada um deles. O primeiro sintoma, o maravilhamento, é quando você lê algo e acha maravilhoso ou incrível. Então, por mais que a gente tenha forçado lá em cima que a leitura beta não é só elogiar o texto, elogiar é sim importante, porque aponta coisas que o autor precisa tomar cuidado para não modificar sem querer durante uma revisão. É importante que você como leitor beta e que você como como o escritor peça ao seu beta anotar quando ele gostou muito de um trecho ou quando ele gostou muito de um acontecimento, etc.

O segundo sintoma, que é o tédio, é meio que autoexplicativo, é aquilo que a gente sente quando está lendo um livro, lendo um texto e chega numa parte que dá vontade de pular. É importante lá que o seu beta anote, “Oh, essa parte está muito chata”, para que você possa depois tentar entender qual é o diagnóstico e o que fazer para resolver, né.

[Thiago Lee] Sim. E falando agora do terceiro sintoma que a confusão, ela é quando o leitor não entende o que está acontecendo ou sente alguma falta de alguma explicação mais específica sobre algum ponto da trama. Já a descrença é quando a famosa “suspensão de descrença” do leitor é quebrada, que é algo que não faz sentido de todo o universo pré-estabelecido da história. Pode ser usado também quando o leitor não acredita na tomada de decisão de um personagem com base no que foi apresentado dele, quando você lê e fala, “ Putz!  Por que foi que ele tomou essa ação? ”, sabe? E se você suspender a descrença da história, isso atrapalha na sua leitura.

Além desses quatro sintomas, é valioso também saber qualquer outro tipo de fluxo de consciência do leitor. Por exemplo, é interessante pedir para o seu leitor ir anotando, enquanto lê, crenças ou teorias que ele tem sobre a trama. Assim dá para ver se a sua história está muito previsível, se você deu alguma dica muito óbvia ou se principalmente, você criou alguma expectativa que não vai ser cumprida nem quebrada propositalmente. É muito normal quando você está betando algum texto, você falar, “Caraca, eu acho que o vilão é fulano”, ou “Acho que esse cara está tramando contra os mocinhos”, e chega na hora e não tem nada disso, você que tirou de sua cabeça e às vezes até o próprio escritor pode pegar isso, tipo, “Gostei dessa sua ideia”, e ele transformar isso numa trama realmente.

[Jana Bianchi] Ou desmentir isso no texto, porque é muito ruim quando você acredita, tipo, “É isso, eu tenho certeza”  e aí não tem nenhum momento que o autor fala, “Não, não é isso. Vocês foram ludibriados”, que é uma coisa legal no texto.

[Thiago Lee] Talvez até você reescrever de forma que realmente pareça que seja isso que está acontecendo, para o leitor ficar “Putz, realmente parece que ele é o vilão”, então você vai escrevendo dando dicas de que ele é o vilão e chegando no final você subverte isso. Você joga para um lado e você subverte o que o pessoal está pensando, sabe? Talvez seja uma dica interessante 

De qualquer maneira, é bom seu leitor beta ir mostrando essas coisas que ele vai pensando durante a narrativa, para você saber quais são as expectativas do leitor.

[Jana Bianchi] Acho que é uma coisa interessante também de você já combinar com seu leitor beta antes, quando for mandar o e-mail, como eu disse agora, explicando o que você quer, que às vezes a gente já sabe como escritor alguma coisa que a gente acha que pode estar insatisfatória no texto, né, que obviamente nós sempre por mais que terminemos o rascunho, sempre vai teremos alguma coisa ali que ainda nos incomoda, e aí eu acho que vai do autor se você vai apontar para pessoa especificamente focar naquele ponto, naquele assunto ou naquele problema que você acha que é um problema. Ou não, eu acho que tem vantagens e desvantagens nos dois. Você pode apontar e você pode enviesar ler a leitura da pessoa ou você pode pedir já para a pessoa focar num negócio que realmente precisa de um trabalho grande em cima. Realmente depende do autor.

Como eu disse agora a pouco, você pode pedir para o seu beta fazer as anotações no arquivo, você pode pedir para ele fazer um parecer geral ali ou, como eu acho que é mais legal e mais completo, ele mandar uma mistura dessas duas coisas. E você como, leitor beta, também pode usar o mecanismo que você achar melhor e mais fácil ou mais prático para se comunicar com o autor. Então tem gente que gosta mandando mensagem conforme vai lendo, “Ah, estou em tal parte e achei tal coisa”, e tem gente também que não gosta nem de avisar que está lendo o texto da pessoa e só resolve dar lá um parecer comentado no final via e-mail. 

De qualquer forma, no final desse processo você como autor vai ter um material mais ou menos detalhado, depende do seu beta, para trabalhar em cima e obviamente você vai precisar responder ou dar alguma satisfação para a pessoa que perdeu tanto tempo esforço e dedicação dela comentando seu livro. Então a gente vai entrar aqui no segundo ponto e vamos falar um pouquinho sobre como reagir a uma leitura beta. 

A primeira coisa é que o seu contato com esse leitor vai ser muito dependente de sua proximidade ou abertura com ele, aquele laço que a gente falou lá em cima. Então você pode tanto marcar um café lá para falar sobre o texto, sobre a betagem da pessoa ou você pode se comunicar de um jeito mais distante, tipo por e-mail, ou você pode escolher bater papo ao vivo pela internet, por chat, por vídeo, enfim. De todo modo a Mary aponta três coisas que você como autor não deve fazer e que o Lee vai começar a falar para você.

[Thiago Lee] O primeiro ponto é: você não precisa se desculpar.

Como a gente já comentou no episódio passado, o seu texto mesmo depois de um tempo na gaveta e das primeiras modificações, ele naturalmente vai ter muita coisa para resolver e você não precisa sentir culpa ou remorso nem nada negativo, você precisa se sentir disposto a mudar o que pode ser mudado para publicar o melhor teste possível. 

Outra coisa que você não deve fazer é discutir. O sintoma que o seu leitor beta descreveu é uma verdade, então não faz sentido você discordar. Não dá para discordar do que a pessoa sentiu, entende? Você pode sim discordar de potenciais tentativas de diagnóstico ou sugestão do que fazer para melhorar. A gente já discutiu lá em cima que eu seu leitor beta não deve focar nisso e se focar, você deve tentar deixar de lado esse tipo de retorno para considerar esses sintomas e sob hipótese alguma você deve ofender seu leitor beta ou brigar com ele por causa de alguma crítica construtiva.

[Jana Bianchi rindo] Imagina, né? É o cúmulo! HAHAHAHA

[Thiago Lee rindo] Sim, é o cúmulo.

Você pode tentar talvez se ele falou, “Gostei da parte X”, você pode questionar, “Mas por que você gostou? E o que foi que você mais gostou? ”, ou senão, “Não gostei”, aí você pergunta, “Tá, mas quais foram os trechos que você acha estavam mal escritos? ”. Vou pode tentar entender e pedir mais detalhes, mas não tentar argumentar, tipo “Ah, mas espera aí, você não gostou porque você não leu até o final”, “Você não gostou porque você não entendeu a motivação dele, você é burro”, mas se ele não entendeu a motivação do personagem, é porque não ficou claro para ele, entendeu? Ele não vai escolher sentir uma coisa ou outra, ele entende o que ele entendeu e ele sentiu que ele sentiu. Cabe a você como escritor tentar fazer com que a sua mensagem esteja mais clara para os leitores, para uma maior quantidade de leitores possível do seu público alvo.

E assim, claro que o leitor não deve ter intenção de ofender gratuitamente ou diminuir ninguém, mas se isso acontecer, a melhor coisa que você faz é ignorar a crítica e tirar essa pessoa da sua lista de betas.

[Jana Bianchi] Sim, e a última coisa que você não deve fazer de jeito nenhum é explicar.

Então assim, os leitores fazem julgamentos do seu texto tendo como única base o texto em si e no máximo, na melhor das hipóteses, alguma conversa que você já teve com ele, se ele está te acompanhando no processo de escrita. Mas se ele não entendeu alguma coisa ou se ele entendeu errado algum conceito por alguma razão, é porque em maior ou menor grau, você deu essa brecha no seu texto. Não existe mistério, isso é fato. 

Claro, que de novo, como o Lee já comentou, diferentes pessoas vão entender de jeitos diferentes o livro, já que grande parte do processo de apreciação de um texto é subjetivo mais do que objetivo. Porém a sua função como escritor é tentar cuidar do texto para deixar o mínimo possível de margem pra interpretações erradas, quaisquer que sejam elas, mas principalmente interpretações que possam beirar a ofensa e então tornar o texto ofensivo ou, sei lá, com algum tipo de preconceito embutido. Sobre isso a gente recomenda inclusive que você confira o nosso episódio de número 020, que foi com a Nathália Dimambro sobre leitura sensível, mas aqui resumindo, no fundo você tem duas opções quando alguém faz uma crítica pontual e ambas começam com ouvir, ou ler no caso, e refletir sobre aquilo.

Então, na primeira opção, se você ouve ou lê, reflete e no fim da reflexão você acha aquilo é pertinente, sua atitude deve ser mudar aquele ponto, inclusive se você entender que ela tem correlação com outras coisas ali que você já pretende mudar no texto, isso acontece muito. Às vezes o leitor comenta um ponto que quando você resolve um outro ponto, você já soluciona naquele, mas você tem que levar ele em consideração.

Já a sua segunda opção é você ouvir ou ler, refletir e se, no fim da sua reflexão, você achar que foi uma interpretação muito pontual de alguma pessoa ou se for alguma coisa que não foi unânime entre os vários betas, que a vantagem de ter mais do que um beta, a sua função é ignorar aquele comentário, não discutir e não rebater, só ignorar. Mas sempre, isso a gente falou no episódio sobre leitura sensivelmente, mas repetindo, tendo sempre a consciência de que isso pode ser apontado mais tarde como um problema por outros leitores e mesmo que seja um leitor, ele está totalmente dentro do direito de interpretar do jeito “errado” o seu texto.

Então eu acho que é basicamente isso, acho que o resumo é que você tem que estar consciente dos problemas do seu texto e você pode tomar a decisão, assumir o risco de continuar com aquele determinado ponto, porque você acha que aquilo cabe nessa história, certo?

[Thiago Lee] Certo, até porque, convenhamos, um texto nunca está pronto, até depois que você passar por leitura beta, leitura crítica, revisão…

[Jana Bianchi rindo] Até depois que você publicar HAHAHAHA.

[Thiago Lee] É. Publicou? Cara, ainda vai ter problemas que assim, você passou na mão de quinze pessoas e ninguém pegou esse problema. Então assim, faça o seu melhor. Esteja rodeado de pessoas em que você confia, que você sabe que fazer um trabalho legal com seu texto e assim, depois de publicado cara, desencana e tenha a consciência que você fez o melhor que você pode, é continuar evoluindo com o tempo.

Bom, eu acho que é o que a gente tem por hoje de conteúdo de leitura beta.

[Jana Bianchi] E se você ficou com alguma dúvida sobre leitura beta, você pode mandar um e-mail para a gente no contato@curtaficcao.com.br ou falar com a gente por twitter no @curtaficcao ou in box na nossa página no Facebook, http://www.facebook.com/curtaficcao . Você pode também comentar no site, que lá os comentários ficam disponíveis para as outras pessoas lerem e discutirem.

E lembrando mais uma vez que, se você curte o nosso conteúdo, existem três jeitos de apoiar a gente. O primeiro é recomendando o Curta Ficção e mandando o episódio no WhatsApp, compartilhando nas redes sociais ou falando para os seus amigos seguirem e ouvirem a gente, o outro é avaliando podcast no seus agregadores de podcast, nós estamos em todos eles, inclusive no Spotify, ou apoiando nosso financiamento coletivo no Catarse (https://www.catarse.me/curtaficcao ) ou no PicPay (picpay.me/curtaficcao).

[Thiago Lee] Isso. E já partindo para os jabás e já estamos no tema também, tem o meu serviço de leitura crítica que eu faço que como falamos aqui, é um pouco mais do que a leitura beta, eu tento pegar alguns pontos fortes da sua narrativa e ver como é que ela talvez possa se encaixar no mercado atual. Normalmente o que eu faço com o pessoal que contrata os serviços, depois que eu passo para eles os pontos no texto comentado, a gente faz uma videoconferência comentando sobre algumas possibilidades de editora que talvez estejam procurando, alguma possibilidade de publicação independente.

É um processo bem honesto que a gente vai conversando, então eu vou deixar o link aqui no post caso vocês tenham interesse.

[Jabás]

[Thiago Lee] E esse foi mais um episódio do Curta Ficção, o podcast de literatura que cabe no seu tempo.

Eu sou o Thiago Lee.

[Jana Bianchi] Eu sou a Jana Bianchi.

[Thiago Lee] E até a próxima pessoal.

[Vinheta de encerramento]